o feito e o pensado cindem a aceitação da miragem. dão duas dimensões para se poder iludir. ambas tranquilizadoras a seu modo. o pensar iludido (há um 'eu', princípio) e o fazer iludido (há forças atuantes que permitem existir) somente oculta a miragem. não importando se ativa ou passivamente - agentes sobrenaturais e abstrações. não importando se na sua gênesis está a sabedoria (deus) ou a ignorância (natureza), ambas se equivalem - produto fabricado. o melhor para sentir essa indiferença fundamental da cisão da aceitação é encararmos a maior das miragens da humanidade: a felicidade! - ilusão oracular, metafísica ilusionista, ideologias naturalistas, astutas inspirações idealistas e o otimismo grandisíssimo filho da fé! autovaloração enigmátiva onde o mundo só existe enquanto não o é fortuito.
a felicidade foi inventada. até aqui tudo bem, arbitrário. no entanto, foi inventada para que seja algum essencial que preceda a existência. um antes e um fazer que possibilita todo agora. quanto já não se gastou em recursos e vidas para defender tal necessidade metafísica? se não tivesse sido inventada a esse modo, não necessitaria de defensores/as. era princípio indiferente à pluralidade. dado o contrário! há uma terrível preocupação permanente, que podemos chamar de desejo, de haver apenas uma forma de viver! ser feliz é a mais alta imposição da ditadura desesperada da religisiodade. e das ideologias: impor que todos/as sejam felizes! um truque mau-caráter - não se define o conteúdo da felicidade mas sim o modo da própria felicidade. e pior! insistência em colocar a felicidade enquanto promessa de explicação e desejo de interpretação. daí começa uma progressão geométrica de invencionices que alterna entre a demonstração e a mostração, ambas impossíveis, pois nunca se mostra sozinha. exemplos: "ser feliz é um estado da alma"; "a felicidade está na trama da vida mesma"; "nada têm a ver com satisfação e prazer"; "sem fé não há felicidade"; "o sofrimento não destrói o ser feliz"; " muitas vezes a felicidade nasce da própria dor". nada que uma retumbante risada não faça desmoronar. ah, o riso fortuito e inercial.
do desespero religioso e ideológico de viver, a impossibilidade de gostar da vida., de se ter o bom gosto de não recorrer a nenhum referencial metafísico. desespero enquanto luta contra reconhecer que se há vida com princípios ou essências que a antecedem, ela é sempre de má qualidade. pois viver só é possível se for resultado de um fazer - é uma produto fabricado. impossibilidade do viver fortuito enquanto ocultamento desesperado. nem vida (o não-dever a existir por algo), nem "eu" (existir sem princípio de causalidade), muito menos felicidade (aptidão de trilhar mil caminhos). não-vida quando esta é entendida para além do berço e do túmulo. não-eu quanto falta de originalidade no pensar, sentir e fazer. não-felicidade quanto estado diferente da fome e da sede. no processo da mortalidade: se vais ficar triste é melhor não se alegrar, e se vais ficar alegre é melhor não se entristecer. deste modo imortal e imaterial da felicidade (estado permanente de espírito), ser feliz torna-se obrigação a todo custo. ser feliz enquanto espera e saudade. ter esperanças. ser saudosista. ter espírito como condição de ser feliz. ou ser obrigado a sê-lo por falta de coisa melhor. eis a grande miragem da humanidade: ser feliz nos torna humanos - somos criação; existimos quanto produção não fortuita; dependemos de razão, origem e princípio organizador.
da recusa da miragem - somente possível a mirando de frente -, tanto no pensar quanto no feito, se instiui outra modalidade de ser poderosa contra a ideologia e a religiosidade da felicidade: a aposta. onde não há interior nem circunstâncias externas - não há absolutamente natureza nem deus; onde não há auto-educação nem auto-deseducação - não há absolutamente racionalidade nem afetividade paranóicas; onde não há espírito para se ter a preocupação de ter que desenvolver poderes latentes - não há como acordar alguém que já está acordado; onde não há a imposição desesperada de que se deve viver intensamente, pois a intensidade aqui nada mais do que a execução do ocultamento e da medida do grau da miragem. no processo dinâmico o único espaço para o ser feliz, como medida de todas as coisas, é o moralismo armado das morais afirmativas e dos agnósticos consolados. portanto, deixo de lado a invensão religiosa e ideológica da felicidade, para avaliar outras formas melhores de se viver - ser feliz não é nem princípio nem força atuante. assim, afirmo que sim, a felicidade é boa ou má, da minha perspectiva ela é uma péssima invensão, pois nos faz correr atrás de coisas materiais e imateriais que não precisamos para viver - recuso introduzir a idéia de força e essência na existência. portanto, enquanto ideólogos/as, religiosos/as e céticos/as ficam aí lutando entre si sobre quem oculta melhor que a felicidade nada mais é do que uma invensão de mau gosto, irei me saciar e ter prazer com outras invensões melhores, por exemplo sacia minha fome com um petisco de buteco e saciar minha sede com uma boa cerveja artesanal.
1 Comentário:
Hum gostei! Vc tem um bom discurso! E até mesmo uma pragmática.
Mas vejo q vc tenta desconstruir o tempo todo todas todas as coisas difundidas na cultura humana!
Vc abre um novo caminho, como q uma tese para uma VISÃO nova pras pessoas, e talvez isso não seja FELIZ, ou não! rs
Boa tarde!
Renata Figueiredo ( a quem vc segue no Twireeeer)
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