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bem vindo e bem vinda. este é um labirinto herege: um desafio para medir a astúcia de quem me visita; um convite à exploração sem mapas e vista desarmada. aqui todas as direções se equivalem. as datas das postagens são irrelevantes. a novidade nada tem a ver com uma linha do tempo. sua estrutura é combinatória. pode começar de onde quiser. seja de uma imagem, de um texto, de um vídeo ou mesmo de uma música. há uma infinidade de escolhas, para iniciar a exploração, para explorar esse território e para finalizá-la. aproveite.

06 [(cor)respondência sexta] - o retorno do diabolus à marcia tiburi

06 [(cor)respondência sexta]


assim falou marcia: “percebi que a literatura e a fotografia eram mais afins do que eu poderia imaginar. também o escritor quer salvar a alma das coisas, de uma história, de um tempo, de uma memória, de um sentido possível...” 

curiosa essa aproximação que vc faz, marcia, entre literatura e fotografia: ambas como resultado de intenções salvacionistas! já que ambas as tecnologias intelectuais seriam geradas com o propósito de salvar, de uma espécie de pecado original – a degeneração diabólica – o instinto vital “das coisas, de uma história, de um tempo, de uma memória, de um sentido possível...”. 

essa curiosa aproximação me faz lembrar um artigo de isaac asimov, chamado “os robôs que conheci”. nesse artigo, asimov nos diz que antes dele (1940), apenas um enredo sobre robôs era viável: o da perigosa criatura mecânica. depois dele, tal melhorou consideravelmente, por uma simples reviravolta de perspectiva criada por ele: a de que robôs não deveriam mais ser considerados imitações diabólicas ou artefatos de maldição da alma dos seres humanos, mas sim máquinas sofisticadas. tal reviravolta é conhecida como “as três leis da robótica”.

asimov? por que eu trouxe aqui tal físico e escritor de ficção científica? robótica? o que tem a ver com a literatura e a fotografia? para sugerir que, analogamente, farei o mesmo: sugir aos/às salvacionistas mergulhados/as na literatura e na fotografia que ambas, tanto não são ferramentas de salvação, quanto não há nada para ser salvo, mas sim que ambas são meras tecnologias intelectuais, bem ou mal projetadas. engraçado, é que existencialistas e outros/as místicos/as, ficarão extremamente incomodados/as com tal sugestão, mas isso aqui pouco importa, inventarei, assim mesmo, aqui minhas “três leis da literatura e da fotografia”, tais quais as da robótica de asimov. mas claro, não perderei de vista que toda lei é inventada, apenas para ser quebrada. vamos lá:

primeira lei: uma literatura e uma fotografia não podem nada salvar, pois não há coisa alguma que possa ser melhorada, corrigida ou sublimada.

segunda lei: uma literatura e uma fotografia devem ser mero suporte possível de pensamento-escrito e pensamento-imagem arbitrariamente e ao bel-prazer de quem escreve e de quem fotografa, a não ser que entre em conflito com a primeira lei.

terceira lei: uma literatura e uma fotografia devem ocupar papel central apenas na imaginação no funcionamento da inteligência, a não ser que essa ocupação entre em conflito com a primeira ou com a segunda lei.

estabeleço que estas leis acima estão firmemente implantadas em cada palavra e imagem da literatura e da fotografia. o resto nasce aqui. – opa, acho que já li esta frase em algum lugar... ah! sim! é o artigo sétimo da lei contra o cristianismo de nietzsche.


assim falou marcia: “enquanto a fotografia nos dá uma memória da morte, a sociedade visual nos dá uma enganação sobre a morte que nos mata.” 

antes, longe de as minhas leis limitar a imaginação inventora elas servem como inspiração. e para testar isso marcia, esta sua ideia é muito boa. primeiro porque desenha um triângulo obtuso (fotografia, morte e sociedade visual) que nos serve como variáveis mínimas para o teste, e depois, porque a morte é nosso horizonte utópico de representação absoluta. 

trecho seu, marcia, “enquanto a fotografia nos dá uma memória da morte...”, trecho de minha primeira lei, “a fotografia não pode nada salvar...”, portanto, nosso primeiro teste, a morte. é possível termos uma morte melhorada, corrigida ou sublimada? ah... quanta religião, filosofia, arte, pseudociência foi inventada para esse propósito? alguma delas conseguiu melhorar, corrigir ou sublimar acontecimento tão inadiável? segundo minha primeira lei, a resposta é não. e ainda acrescentaria que tais invenções, no máximo, conseguem ocultar para o auto-engano! 

seguindo, é possível termos memória da morte? a fotografia passa pela minha segunda lei, já que ela nos serve como suporte possível de pensamento-imagem arbitrariamente e ao bel-prazer de quem fotografa. pois, é impossível uma memória autêntica, já que só quem lembra é quem está vivo. mortos/as não tiram foto. a memória no caso é um lembrete, um tipo de memória artificial (arbitrária), do que logo irá acontecer, a morte. e nesse sentido, a fotografia como memória/lembrete “ocupa papel central na imaginação no funcionamento da inteligência”. 

marcia, agora, vamos ao segundo trecho de sua ideia, “a sociedade visual nos dá uma enganação sobre a morte que nos mata”. hahahaha, veja que curioso! tal é a própria expressão do conflito com minha primeira e segunda lei. pois a intenção enganadora da sociedade visual que tu dizes, é o que logo acima eu disse como “ocultar para o auto-engano”. pois sozinho/a e vivos/as fotografamos. como um/a morto/a não pode fotografar, uma sociedade também não. a “morte que nos mata” é a própria mortalidade constitutiva de qualquer vivente: do/a fotógrafo/a, da fotografia, seja ela impressa ou em condição digital. e como aqui assumi uma posição mais mecanicista, a lá asimov, e menos moralista, a lá salvacionista, tanto um/a morto/a quanto uma sociedade são desprovidos/as de inteligência em funcionamento. ou seja, não possuem imaginação para tal (minha terceira lei), o único que ocupa papel central é o “ocultar para o auto-engano”. 

assim, levada em consideração a aplicação que fiz de minhas três leis, uma última sugestão, no caso, uma correção: para que uma sociedade visual abandone sua perspectiva enganadora/ocultante e limitante/auto-engano, ela deve se tornar uma associação visual; tornar-se uma associação para o visual, como comumente se fazem uma associação para o crime, ou seja, trazer para dentro de si a terminalidade própria de quem fotografa (nada poder salvar, arbitrariedade, imaginação inventora) e da fotografia mesma (suporte de pensamento imagem, memória/lembrete). 

léo, amante da heresia




rosto de árvore tombada – asa sul – brasília | léo pimentel | 2010



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